A minha carne é fraca

Atenção! Este não é mais um artigo sobre a tal operação da polícia federal, mas sim sobre as reverberações deste tipo de acontecimento. Estamos todos espantados como as coisas repercutem nos tempos de internet e redes sociais. Já nem assustamos mais com a velocidade, o que mais nos assusta é como surgem opiniões tolas, loucas, ignóbeis dos mais diversos tipos de pessoas – todas se julgando especialistas.

Nossa primeira reação é culpar o Facebook, as emissoras e a internet, mas atenção: a culpa não é delas! Elas estão apenas “esfregando” o espelho na nossa cara, mostrando-nos nossas imperfeições. Aqui mesmo já podemos ver uma delas: responsabilizar os outros pela nossa desgraça.

As redes sociais deram voz a qualquer pessoa. Qualquer um pode divulgar sua opinião sobre qualquer assunto. E aqui está outra imperfeição humana – o pedantismo (demonstrar conhecimentos que não possui; ostentar cultura, erudição)

Se pararmos para pensar: sempre foi assim. Lembra-se dos tempos de escola? Em 1980, um primo de um amigo da minha tia disse que faziam salsicha com jornal. Sempre tinha os entendidos do assunto! Seja no futebol, na religião, nas modinhas adolescentes. Era importante demonstrar conhecimento, isso gerava reconhecimento e pertencimento – isso é humano. Além do mais, é importante ser ouvido, é importante expressar opiniões e sentimentos: o problema é que todo mundo quer falar, mas ninguém quer ouvir!

Temos vários exemplos para pegarmos como estudo de caso: lava-jato, carne fraca, mensalão, Donald Trump – mas quero refletir um pouco sobre a carne fraca, pois esta não envolve partidos políticos, apesar de haver compartilhamentos dizendo o contrário, que por sorte não emplacaram (acho que desta vez a culpa não foi do FHC).

Encontrei algumas reverberações sobre a carne fraca:

  • Culparam o Tony Ramos, Fátima Bernardes e o Roberto Carlos;
  • Disseram que o Lulinha é um safado;
  • Os Estados Unidos estão por de trás dessa operação, com o objetivo de minar nossas exportações;
  • Nossa carne é imprópria;
  • 752.922 piadas e memes (apurados até o encerramento deste artigo)
  • Nossa polícia federal é pirotécnica, espetaculosa;
  • A Rede Globo está lucrando com os anúncios.

Muitas opiniões se formaram a respeito do tema, muita m*#@ para nossos ouvidos. Muitos entendidos do assunto! Por Deus! É tão difícil formular uma opinião. Mais difícil ainda: se manter fiel a ela! Sou mais Raul Seixas com a sua metamorfose ambulante. A medida em que as coisas evoluem, neste caso, a medida em que os fatos aparecem, o julgamento é afetado.

Só consigo pensar em duas razões para alguém sair palestrando besteira sobre algum assunto: ignorância ou má fé! E uma horda de ignorantes ou massa de manobras compartilha tais bobagens. Já chamei a atenção sobre os impactos compartilhar as coisas sem saber (ou mesmo sem ler/ver), não faça parte deste ingrato grupo (veja em: “Só acredito vendo” e “Avalanche de informações”).

Quer saber a minha opinião sobre o episódio? Se a resposta for sim, leia o parágrafo abaixo, do contrário, passe diretamente ao seguinte.

Vejo esta operação com naturalidade. A indústria alimentícia trabalha duro para a qualidade dos seus produtos. Ela sabe o impacto que um produto estragado ou adulterado pode causar na sua marca. Pior ainda: o impacto de algum problema de saúde em seus consumidores. Ao mesmo tempo, esta mesma indústria trabalha duro para se manter no mercado: enfrentar concorrentes, gerar lucro. Por vezes alguns profissionais são pressionados ou tentados a praticar ações ilícitas ou inescrupulosas para obter vantagens ou manterem-se no emprego. Para isso temos órgãos responsáveis por examiná-las e creditá-las. O problema é que esses órgãos também têm profissionais pressionados e tentados a praticar esses mesmos atos. E no final das contas, quem devia nos proteger, protege a si mesmo. O problema é que no Brasil parece haver grande quantidade desses profissionais. Será verdade? Acredito que sim, mas tenho certeza de que é menos do que pensamos, afinal, quando falta caráter: manchete em jornais e grande repercussão nas redes; mas quando ocorre um bom gesto: pouco se fala! Alguém reparou que pouco destaque se deu ao funcionário honesto do Ministério que denunciou o esquema? Esse é o meu herói! O problema parece estar mais ligado a política e a corrupção do que a segurança alimentar.

Minha opinião está baseada em duas fontes:

  1. Papelão e substância cancerígena ou exagero? O que se sabe – e o que é dúvida – na Operação Carne Fraca” – BBC Brasil;
  2. Carne Fraca é a nova Lava Jato, diz fiscal que denunciou esquema de venda de carne adulterada” – CBN Curitiba.

Responsabilizar os outros, trapacear, fofocar, iludir, cobiçar, exibir-se, proteger-se, promover-se – tudo isso é humano! Quem se habilita a atirar a primeira pedra? Por isso, meus queridos amigos, procuro falar apenas daquilo que entendo, e com a certeza de que sempre terei mais a entender; me esforço para ser receptivo às opiniões divergentes; e evito desviar minha atenção à lisura dos meus gestos, comportamentos, palavras e ações, afinal: minha carne é fraca!